Cardeal Domenico Bartolucci celebrando missa prelatícia em Roma, em 8 de dezembro de 2010, por ocasião da festa da Imaculada Conceição de Nossa Senhora. |
Oferecemos um trecho da tradução portuguesa de uma entrevista de Monsenhor Domenico Bartolucci, de 92 anos, nomeado por Pio XII maestro “ad vitam” da Capela Sixtina, mas afastado do cargo em 1997 devido a uma intervenção de Mons. Piero Marini. A entrevista se trata de uma iniciativa do Abbé Stefano Carusi, do site Disputationes Theologicae, do Instituto do Bom Pastor.
Maestro, a recente publicação
do Motu Proprio “Summorum Pontificum” trouxe um sopro de ar fresco no
desolador panorama litúrgico que nos rodeia; também o senhor pode agora,
portanto, celebrar a “Missa de sempre”.
Mas, para dizer a verdade, eu sempre a
celebrei ininterruptamente, desde a minha ordenação… Por outro lado,
teria dificuldade em celebrar a Missa no rito moderno, uma vez que nunca
o fiz.
Nunca abolida, então?
São as palavras do Santo Padre, ainda que
alguns finjam não entendê-las e mesmo que muitos no passado tenham
sustentado o contrário.
Maestro, será necessário conceder aos difamadores da Missa antiga que ela não é “participada”…
Não digamos disparates! Conheci a
participação dos tempos antigos tanto em Roma, na Basílica, como no
mundo, como aqui abaixo no Mugello, nesta paróquia deste belo povo, um
templo povoado de gente cheia de fé e piedade. O domingo, nas vésperas, o
sacerdote poderia se limitar a entoar o “Deus in adiutorium meum
intende” e logo pôr-se a dormir sobre o assento… os camponeses
continuariam sozinhos e os chefes de família teriam pensado em entoar as
antífonas.
Uma polêmica velada, Maestro, a respeito do atual estilo litúrgico?
Não sei se – ai de mim! – já estiveram
num funeral: “aleluia”, aplausos, frases risonhas, alguém se pergunta
se essa gente leu alguma vez o Evangelho; Nosso Senhor mesmo chorou
sobre Lázaro e sua morte. Aqui, com este sentimentalismo insosso, não se
respeita nem sequer a dor de uma mãe. Eu lhes havia mostrado como o
povo assistia a uma Missa de defuntos, com que compunção e devoção se
entoava aquele magnífico e tremendo “Dies Irae”.
A reforma não foi feita por gente consciente e doutrinariamente formada?
Desculpe-me, mas a reforma foi feita por
gente árida, lhes repito, árida. E eu os conheci. Quanto à doutrina, o
Cardeal Ferdinando Antonelli, de venerável memória, costumava dizer com
freqüência: “como fazemos liturgistas que não conhecem a teologia?”
Estamos de acordo com o senhor, Monsenhor, mas é certo também que o povo não entendia…
Caríssimos amigos, leram alguma vez São
Paulo: “não importa saber mais do que o necessário”, “é necessário amar o
conhecimento ‘ad sobrietatem’”? Daqui a alguns anos se tentará entender
a transubstanciação como se explica um teorema de matemática. Mas se
nem sequer o sacerdote pode compreender até o fundo tal mistério!
Mas como se chegou, então, a esta distorção da liturgia?
Foi uma moda, todos falavam, todos
“renovavam”, todos pontificavam, na esteira do sentimentalismo, de
reformas. E as vozes que se levantavam em defesa da Tradição bimilenar
da Igreja eram habilmente caladas. Inventou-se uma espécie de “liturgia
do povo”… quando escutava estas frases me vinham à mente as palavras de
meu professor do seminário que dizia: “a liturgia é do clero para o
povo”, ela descende de Deus e não de baixo. Devo reconhecer, contudo,
que aquele ar fétido se fez menos denso. As gerações de sacerdotes
jovens são, talvez, melhores que as que as precederam, não têm os
furores ideológicos dominados por um modernismo iconoclasta, estão
cheios de bons sentimentos, mas lhes falta formação.
O que quer dizer, Maestro, com “lhes falta formação”?
Quero dizer que queremos os seminários!
Falo daquelas estruturas que a sabedoria da Igreja elegantemente
cinzelou durante os séculos. Não se dá conta da importância do
seminário: uma liturgia vivida, os momentos do ano são vividos
“socialmente” com os irmãos… o Advento, a Quaresma, as grandes festas
que seguem a Páscoa. Tudo isso educa, e não se imagina quanto! Uma
retórica tonta deu a imagem de que o seminário arruína o sacerdote, de
que os seminaristas, afastados do mundo, permanecem fechados em si
mesmos e distantes do povo. Todas fantasias para dissipar uma riqueza
formativa plurissecular e para substituí-la depois com nada.
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